Longínqua,
mas ainda presente em mim está a memória de abissal solidão que em tempos vivi.
Tempos conturbados, onde a força do vazio sarapintava o meu coração de migalhas
de amor e me empurrava os dedos freneticamente para as teclas do telefone, onde
de contacto em contacto passava horas em busca de companhia.
Como
um naufrago a esbracejar sem tábua de salvação, curiosamente (ou não), quanto
maior era o vazio, menor era a disponibilidade daqueles para quem ligava, o que
reforçava aquela dolorosa certeza de “não-ter-ninguém” e a minha tão profunda
inadequação.
Recordo-me
da dor que sentia ao observar o mundo da janela do meu quarto.
Todos
pareciam acompanhados, excepto eu.
Recordo
também com uma especial nitidez, o som do sino da igreja que a cada meia hora,
repenicava dentro de mim, relembrando-me que as horas iam passando, o dia
movimentava-se em toda a sua plenitude e eu…continuava só.
Cada badalada
ressoava em mim como se de uma sentença de morte se tratasse - hoje percebo que
era uma sentença sim, mas… de Vida.
Afinal,
se estava só era porque ainda não sabia estar acompanhada.
Aos
poucos, fui caminhando e inevitavelmente o caminho foi-se abrindo.
O véu
da ilusão foi caindo e a visão outrora turva começou a revelar-se cada vez mais
nítida. Mais atenta ao que dentro de mim acontecia, comecei a perceber que aquela
dolorosa sensação, também me acontecia na companhia de algumas pessoas com as
quais tinha deixado de sentir identificação. Lembro-me de constatar na altura, que
as conversas banais e sem conteúdo, contribuíam tanto para aquela dor de
solidão, como o canto da minha casa onde me sentava à espera que o telefone
tocasse.
De
facto, presença é muito mais que companhia e o que a vida queria era que eu entendesse
e integrasse isso, para poder sair da limitada limitação de acreditar que era o
outro que eu esperava, para resgatar a companhia que até à data não tinha
conseguido encontrar dentro de mim.
Hoje
sei, que se havia alguém que eu esperava para sarar aquela imensa ferida de
solidão, esse alguém era EU, mais ninguém.
E,
assim pulando de ilusão em ilusão, de experiência em experiência, fui abrindo espaço
de reencontro comigo mesma.
Outrora
amargo, o sabor vazio da solidão, foi-me adocicando aos poucos e tatuando em
mim a mágica beleza da solitude.
Espaço
sagrado de silêncio, de mergulho interior, de união com o divino, a solitude
ensinou-me que não existem espaços vazios, quando se está em profunda comunhão
consigo mesmo e com a natureza que cá dentro habita.
Hoje,
procuro menos e encontro mais.
Não
vasculho o telemóvel em busca de companhia, pois a presença de quem realmente
me acompanha não precisa sequer de nº de telefone como intermediário.
Hoje,
por estar cada vez mais comigo deixei de me sentir só.
Escolho
qualidade em vez de quantidade e silêncio em vez de ruido.
Os
cantos da minha casa deixaram de receber o meu desespero e são agora pontos de
acolhimento da paz que me invade, sempre que o imenso prazer da solitude quer estar
junto de mim.
Hoje
sei.
Estar
só não é estar ausente de companhia do outro, mas sim estar ausente da sua própria
companhia.
E,
eu… há muito que deixei de estar.
Espetacular! Eu deixei de me sentir só, quando me encontrei...
ResponderEliminarEspetacular! Eu deixei de me sentir só, quando me encontrei...
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