domingo, 17 de janeiro de 2016

A DOR É INEVITÁVEL. O SOFRIMENTO OPCIONAL.

Se conseguíssemos viver a Vida, como ela se nos apresenta, isto é se fossemos capazes de viver sem expectativas, projecções futuras ou desejos, seríamos absolutamente felizes.
Com isto, não quero dizer que deixaríamos de sentir dor.
A dor existe para nos elevar a níveis mais subtis de nós mesmos, que só a sua vulnerabilidade permite, logo não só é inevitável, como alquímica e profundamente iniciática. 
Já o sofrimento advém do facto de não aceitarmos, nem a dor, nem as dinâmicas da Vida tal e qual como elas se nos apresentam.
Assim sendo, é evitável e opcional.
Ao atravessarmos a dor, honrando-a como uma dádiva e não como um “erro-de-deus”, poderemos com ela aprender lições incríveis.
Se por outro lado nos opusermos impetuosamente aos acontecimentos que não estão ao nosso alcance controlar, desgastamo-nos, perdemos grandes oportunidades de aprendizagem e principalmente causamos grande sofrimento a nós próprios e a quem nos rodeia.   
Quando aceite e integrada a dor, tem o seu tempo, as suas fases, mas como tudo na Vida…passa.  
Já o sofrimento muitas vezes resulta de um estranho apego à dor, pois mantê-la viva, parece condensar em nós histórias que nos marcaram e às quais muitas vezes colamos a nossa identidade.
Recordo-me sempre daquele episódio da senhora que 25 anos após o marido ter saído de casa, todos os dias colocava a aliança no dedo e maldizia o seu destino com aquele homem.
A dor tinha passado, mas ela precisava manter a mágoa, o sofrimento, numa tentativa de não deixar morrer o que há anos já estava enterrado.

Se pararmos para reflectir é fácil perceber que quando vemos um filme ele só funciona, quando…não funciona.
Nele tem de haver um drama, um imprevisto, algo capaz de criar suspense e nos fazer vibrar.
Ora, é exactamente isto que fazemos na Vida.
A grande diferença está, que no filme, queremos imprevisto, suspense e enredo que não acabe nunca ou se acabar que tenha um final feliz.
Na nossa Vida, queremos um “bocadito-de-enredo”, de preferência que não nos enrede em demasia, e definitivamente não queremos qualquer imprevisto.
Desejamos permanência, numa natureza impermanente.
Previsibilidade, quando somos governados por condições totalmente imprevisíveis e que fogem totalmente ao nosso controle.
Esta forma de nos posicionarmos, opõe-se totalmente ao fluxo natural da Vida.
Está assim iniciada uma dura batalha, entre o nosso “desejo”, que obstinado quer que as coisas sejam o que desejamos que elas sejam, e a Vida que naturalmente vence sempre, mostrando-nos com inteligência, que elas são o que são, ainda que não o que gostaríamos que fossem.              
A causa do todo o sofrimento é antes de mais, a grande falta de aceitação perante aquilo que a Vida nos dá.
Na verdade a chegada e a partida são dádivas divinas que nos acontecem para que nos possamos cumprir.
No intervalo entre uma e outra, acontece-nos a Vida.
A Vida que somos.
Sempre.
Apesar da dor e muito para além do sofrimento.     

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